A forma mais simples de explicar a diferença entre os mercados primário e secundário é fazendo uma analogia com o mercado de automóveis. Desconsiderando (intencionalmente) os pormenores da venda de um carro (como a necessidade ou não de uma concessionária atuando como intermediária), um fabricante de carros ganha dinheiro quando vende o caro “zero quilômetro”. Fim.
A partir do momento em que o carro é vendido, ele deixa de ser “zero”. Daí em diante, pode ser vendido de novo “n” vezes e nenhuma dessas transações subsequentes vai ter impacto financeiro para o fabricante de carros.
O mercado primário de títulos
Chamamos de mercado primário de títulos aquele mercado (aqui falando de forma mais figurativa) em que os títulos financeiros “nascem”. É onde os títulos “zero quilômetro” são vendidos para os seus primeiros donos.
Este é o momento em que o emissor do título “coloca dinheiro para dentro de casa”. O emissor, no caso, pode ser uma empresa (quando lança ações ou debêntures), um banco (quando lança títulos de crédito representativos de depósitos bancários) ou mesmo o Governo (quando distribui títulos públicos recém-emitidos em leilões).
Mas a regra vale, tecnicamente, para qualquer situação. Se você fizer um pagamento com um cheque pré-datado (isso ainda existe?), esse cheque é, a rigor, um título que está sendo lançado no mercado primário.
Então, a gente pode dizer que, no mercado primário, é onde se gera “valor econômico real”, pois é onde as empresas vão obter dinheiro para comprar máquinas, construir fábricas e por aí vai…
O mercado secundário de títulos
Lembra daquele cheque pré-datado que falamos anteriormente? Imagine que a pessoa que o recebeu o tenha vendido para outra pessoa (ou uma factoring, por exemplo)… E você nem ficou sabendo disso! Pronto, agora temos uma transação no mercado secundário!
O mercado secundário de títulos é o “mercado de carros usados” do mercado financeiro. Ali, as transações acontecem entre investidores e traders que trocam títulos de mãos, sem gerar impacto financeiro direto nos emissores. Quando um investidor está vendendo sua ação da empresa “XYZ” para outra pessoa, o único impacto financeiro dessa transação é no atual dono da ação (o vendedor) e quem estiver comprando. A “XYZ” não vai ganhar nem perder um centavo com essa transação.
Isso vale para ações e títulos de renda fixa, sejam de empresas, bancos ou governos. Se a negociação ocorre com títulos “já emitidos”, é mercado secundário. Consequentemente, essas transações não tem impacto direto no emissor daqueles títulos (que já recebeu o dinheiro “lá atrás”).
Então, a rigor, podemos dizer que uma empresa “não está nem aí” com o que acontece com suas ações depois de emitidas (mas aguarde… tem uma pegadinha neste raciocínio!). Para os gestores de uma empresa, pode ser “super legal” ver as ações se valorizando rumo ao espaço sideral. Será mais legal ainda se eles próprios forem acionistas… Mas, para a empresa, não tem muito significado financeiro.
Então, por que emissores se preocupam com o mercado secundário?
Pois é… As variações de preço dos títulos no mercado secundário não importam para o emissor. Só que… importam!
De fato, não há impacto financeiro numa empresa quando as ações valorizam ou desvalorizam (afinal, o dinheiro já foi recebido quando as ações foram lançadas). Porém, raramente uma empresa de capital aberto lança ações uma única vez…
Em algum momento, ela lançará novas ações e, se for uma empresa que criou uma imagem de quem não dá a mínima para o investidor (na linha “eu já peguei o dinheiro que precisava, agora vocês que se f####…”), certamente terá MUITA dificuldade em obter dinheiro quando precisar novamente.
Aqui, podemos voltar à analogia dos carros. Uma montadora não tem nenhum ganho direto com as transações que acontecem no mercado de carros usados. Apesar disso, elas procuram investir na imagem de que seus carros são “bons de venda” na hora de se desfazer – que são fáceis de vender e que não desvalorizam tanto quanto os outros.
E fazem isso porque, naturalmente, essa boa imagem no mercado de carros usados (que é o análogo ao “mercado secundário” de ativos financeiros) ajuda a vender carros novos! Mais que isso, algumas montadoras se apoiam nessa fama de carros que “desvalorizam menos” para cobrar mais carro nos carros zero quilômetro (e as pessoas pagam!).
Por isso, a ideia de que um emissor “não ganha nada” com o mercado secundário é conceitualmente correta, mas praticamente errada…
Conclusão
A grande geração de valor econômico ocorre no mercado primário. O mercado secundário gera pouco ou nenhum valor econômico. O mercado secundário apenas “gera calor” (podemos assim dizer…).
Inclusive, algumas pessoas não muito “simpáticas” ao mercado financeiro como um topo têm uma visão bastante negativa do mercado secundário (ainda que não saibam o que seja o mercado secundário). Dizem coisas como “no mercado financeiro só tem especulação”, “ninguém produz nada” e coisas do gênero…
Bem, elas estão corretas. Porém, desconhecem um pequeno (e fundamental) detalhe: Os mercados secundários geram LIQUIDEZ na economia. Eles permitem que os ativos financeiros circulem livremente e que os detentores desses ativos os vendam quando quiserem.
Sem a existência de um mercado secundário líquido e ativo, os emissores de títulos terão grande dificuldade em lançar títulos no mercado primário para se financiarem. Poucos investidores vão querer adquirir títulos financeiros e “morrer abraçados” com eles por falta de liquidez.
Assim sendo, se o mercado secundário simplesmente deixasse de existir, isso inviabilizaria o financiamento via mercado primário. Isso, por sua vez, inviabilizaria a atividade econômica como um todo.
Tentar acabar com a “especulação” do mercado secundário é, assim, um grande equívoco, que poderia levar a efeitos econômicos desastrosos.
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