Value Investing (“Investimento em Valor”, em tradução livre) é uma modalidade de investimento em ações de linha fundamentalista. Ser “de linha fundamentalista” significa que as análises são feitas em informações fundamentalistas (econômicas, setoriais e da própria empresa). É, então, uma “subespécie” de análise fundamentalista.
É uma metodologia bastante popular, relativamente fácil de ser compreendida e com um bom histórico de sucesso. Porém, como veremos ao longo deste artigo, ela não é de fácil aplicação.
O conceito básico do Value Investing
Há certo debate se o Value Investing é uma metodologia, uma técnica ou uma filosofia (para alguns, é quase uma religião). Mas, para todos os efeitos, vou me referir como “metodologia”.
O Value Investing é uma metodologia que busca o chamado “alfa” (ou seja, ganhos acima daquilo que o mercado oferece naturalmente). É uma metodologia ativa de base fundamentalista. Isso significa que ela parte do princípio de que os mercados NÃO são eficientes (todas as metodologias ativas partes desse pressuposto) e que é possível explorar essas ineficiências para obter ganhos superiores ao mercado.
O pilar do Value Investing está num conceito chamado “valor intrínseco”. Valor intrínseco seria, em termos gerais, o “valor real” da empresa, que não necessariamente é o preço de mercado de suas ações.
Em um mercado eficiente, “preço” e “valor” deveriam ser sempre iguais. Porém, num mercado ineficiente, o preço pode se “descolar” do valor. Por exemplo, às vezes, o mercado pode ficar “doidão” por algum motivo, e os preços de uma ação podem subir exageradamente, sem que haja alguma coisa “concreta” por trás dessa subida. De forma análoga, o preço de uma ação pode cair sem que tenha acontecido alguma mudança fundamental na empresa. Essas oscilações são baseadas em expectativas, medo, ganância… Enfim, basicamente são fatores emocionais e são um reflexo da irracionalidade dos investidores e agentes da economia.
O “Value Investor” (nome do investidor adepto do Value Investing) procura fazer duas coisas:
A primeira é determinar qual é esse tal “valor intrínseco”. Esse valor não é publicamente declarado (a única coisa publicamente declarada é o preço). Então, o investidor ou analista precisa, usando alguma técnica (mais sobre isso adiante), determinar qual é o valor intrínseco.
A segunda coisa é comparar os preços de mercado das ações com seus valores intrínsecos, e identificar aquelas em que o preço esteja significativamente abaixo do valor. Ou seja, ações que estejam Baratas” EM RELAÇÃO ao seu valor intrínseco.
É importante ressaltar o “em relação” pois Value Investing não é comprar “ações baratas”. Ações, assim como produtos e mercadorias, podem estar baratas por serem uma porcaria, e não por serem uma boa oportunidade. Por isso, não se busca ações baratas em termos absolutos, mas sim baratas em relação ao valor.
Ao comprar ações “baratas” em relação ao valor intrínseco, a expectativa é que, em algum momento, o mercado irracional “caia em si” e os preços convirjam em direção ao valor.
As origens do Value Investing
Procurar comprar ativos por preço abaixo de seu real valor não é nenhuma novidade. Pelo contrário, esse tipo de prática existe desde que inventaram os primeiros mercados, na época em que a economia funcionava na base do escambo.
Mas o nome “Value Investing” foi disseminado por Benjamin Graham, um professor de finanças da Universidade de Columbia, nos EUA. Ele é autor de um livro “clássico” do mundo das finanças (chamado “O Investidor Inteligente”) e, entre outras coisas, criou o conceito de “margem de segurança”, que seria uma espécie de intervalo de preços ideal entre o preço de mercado e o valor intrínseco.
Outro conceito interessante do Benjamin Graham é a descrição do mercado na figura do “Senhor Mercado”, um sujeito meio bipolar que, em alguns momentos, está eufórico e em outros está com medo. Essa metáfora do “bipolar” serve para ilustrar a irracionalidade dos mercados, onde os preços dos ativos podem estar, sem razão lógica, muito acima ou muito abaixo dos seus valores.
O Value Investing foi criado pelo Benjamin Graham, mas o maior “garoto propaganda” da metodologia é um aluno dele: Warren Buffett, gestor da holding Berkshire Hathaway e um dos homens mais ricos do mundo.
Ele praticamente se tornou sinônimo de Value Investing (apesar de, frequentemente, não fazer aquilo que ele mesmo prega…).
A definição do valor intrínseco
Como deve ter dado para perceber, o conceito geral do Value Investing é muito fácil e intuitivo. Pega o preço de um lado, o valor intrínseco do outro e compara… Se o preço estiver significativamente abaixo do valor (esse “significativamente” é determinado pela margem de segurança) é pra comprar… Simples assim.
O grande segredo está na definição do valor intrínseco pois, como foi comentado antes, ele não é um valor público e combinado pelo mercado. Então, cabe ao analista ou investidor definir qual é o valor intrínseco para fazer a comparação.
Existem duas formas “comuns” de aferir o valor intrínseco. Mas, antes de falar delas, quero fazer a seguinte ressalva: Os detalhes e as parametrizações usadas nessa definição podem variar muito. Mais que isso, investidores profissionais costumam ter modelos proprietários de avaliação de ações e esses modelos são mais protegidos que a fórmula da Coca-Cola… Por isso, não espere encontrar alguma “receita de bolo” na internet (bem, pelo menos uma receita que funcione…).
Mas vamos à formas mais comuns de definir o valor:
Através de múltiplos financeiros
É a forma mais simples. Múltiplos financeiros (ou ratios, em Inglês) são indicadores construídos com base em informações da empresa, sejam das demonstrações financeiras (Balanço Patrimonial e Demonstrativo de Resultados) ou os preços de mercado das ações.
O mais comum e popular indicador de valor é o “Índice Preço/Lucro” (P/L), que é o preço da ação dividido pelo lucro dos doze meses anteriores. Existem inúmeros outros indicadores (inclusive indicadores que ainda estão por ser criados…), mas o P/L é o mais conhecido.
Se compara o P/L de uma empresa com o P/L médio de empresas similares, ou com um número arbitrário. Baseado nessa comparação, se deduz se a ação está cara ou barata.
A vantagem da avaliação por múltiplos é a objetividade – o múltiplo é um número que vai ser comparado com outro número. “Ou é ou não é”… Não tem muita margem para interpretação aqui.
Porém, é um tipo de avaliação limitada e, na visão de alguns analistas, “tosca”. Esse tipo de avaliação não permite levar em conta as especificidades da empresa.
Através de fluxos futuros
A outra forma de fazer avaliação é através de fluxos financeiros futuros trazidos a valor presente (descontados). O mais comum é usar o fluxo de caixa futuro, usualmente por período de cinco anos.
A fórmula do desconto de fluxos futuros é uma fórmula matemática exata. Porém, as premissas usadas são estimadas. O quanto que a empresa vai gerar de caixa nos próximos cinco anos e qual vai ser a taxa usada para descontar esses valores são informações que precisam ser estimadas pelo analista. Ou seja, a subjetividade desse método é gigantesca e raramente uma avaliação feita por dois analistas diferentes vai dar o mesmo resultado.
É um tipo de avaliação muito mais sofisticada que a avaliação por múltiplos pois, nessa estimativa de fluxos futuros e de taxa de desconto, o analista pode considerar toda a sua “visão” para o futuro daquela empresa.
Qual método é melhor?
A resposta aqui é, como quase tudo no mundo das finanças, um grande “depende”… Mas vou dar a minha opinião pessoal.
Se um investidor comum pretende fazer suas próprias análises, a avaliação por múltiplos, provavelmente, será melhor. Ela é fácil e objetiva. Existem serviços na internet que já informam os múltiplos “prontos” e é só comparar com os parâmetros definidos. Não tem muito segredo.
Só que, como já foi comentado, a avaliação por múltiplos é meio “fast food”. Não tem muito refinamento.
Se o investidor preferir fazer desconto de fluxos futuros, tudo bem. Não é difícil. Qualquer “Zé Arruela” que saiba usar uma calculadora HP ou uma planilha Excel consegue fazer isso. Porém, a finesse está na estimativa dos fluxos e da taxa de desconto. E aqui, a sensibilidade e o conhecimento de um analista profissional, especializado naquela empresa ou segmento, quase sempre vai superar a do investidor leigo.
Por isso, quem preferir seguir por esse caminho, é interessante considerar a possibilidade de usar análises feitas por profissionais. A propósito, fica como sugestão de leitura meu artigo “Analistas de investimentos – Até que ponto são confiáveis?”.
Qual é a “grande dificuldade” do Value Investing?
A maior dificuldade do Value Investing (que faz com que poucos investidores o sigam de forma correta) não é técnica, mas sim emocional e comportamental.
As boas oportunidades em Value Investing costumam surgir quando os mercados estão deprimidos, e elas tendem a escassear quando os mercados estão eufóricos e em níveis altos.
Existem ações e segmentos que são contracíclicos mas, mesmo em mercados desenvolvidos, a correlação entre as ações é muito grande e existe essa tendência de “cai todo mundo junto” e “sobe todo mundo junto”.
O investidor comum é fortemente orientado pelas emoções e pelo “comportamento de rebanho”. Tende a querer entrar na bolsa quando ela está “na moda” (leia-se, em níveis elevados) e fica refratário a investir em ações quando os mercados estão em baixa (e todo mundo fica dizendo que o mundo acabou e vamos voltar para as cavernas…).
O Value Investing “força” o investidor a fazer o contrário disso. A comprar na baixa (quando surgem as oportunidades de comprar barato em relação ao valor) e a vender (ou ficar “quietinho no seu canto”) quando o mercado está eufórico e todo mundo “só fala em bolsa”.
Outra coisa que frustra um pouco os investidores é que as empresas que se enquadram nos critérios de Value Investing são, geralmente, aquelas empresas mais “sem graça” e desprezadas pelo mercado. As empresas “charmosas” raramente ficam com seus preços significativamente abaixo dos valores intrínsecos.
Ou seja, se você é uma pessoa que gosta de estar “na moda”, o Value Investing NÃO É para você.
Ele exige disciplina (e coragem) para comprar quando a maioria está vendendo e vender quando a maioria está comprando.
Últimas considerações
De todas as metodologias ativas de investimento, o Value Investing é uma das que mais acumula evidências de efetividade. Porém, ela não é perfeita e pode acontecer (e ocasionalmente acontece) de um investidor seguir “fielmente” as práticas do Value Investing e ter retornos abaixo do mercado (ou mesmo negativos).
É importante ressaltar essa “não-infalibilidade” do Value Investing (ainda que pareça ser uma metodologia superior) pois alguns adeptos tendem a ter uma visão “cultista” e dogmática, idolatrando Benjamin Graham e Warren Buffett como se fossem uma divindade e seu mensageiro, e atacando todas as outras metodologias e filosofias de investimento.
As evidências são fortes de que o Value Investing é uma metodologia que tem vantagens significativas em relação às outras. Mas, como sabemos, “finanças” não é uma ciência exata e não existe jeito comprovadamente “certo” de investir.
Cada investidor se adapta melhor a um estilo, seja de investimento ou de trading.
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