09/09/2020 • • por Andre Massaro

Parasitas financeiros – filhos que exploram financeiramente os próprios pais


Antes de começarmos este artigo, um aviso importante: O foco, aqui, são filhos ADULTOS que, supostamente, já deveriam ter cortado o “cordão umbilical financeiro” e estar em capacidade de tomar conta de suas próprias vidas.

Porém, esses filhos seguem, em maior ou menor grau, explorando financeiramente os próprios pais, por incapacidade de atingirem a própria independência financeira ou, em alguns casos, por puro comodismo.

Minha experiência no assunto

Eu sempre gosto de começar meus conteúdos (especialmente aqueles sobre temas controversos) com algum tipo de disclaimer, para poupar as pessoas de fazerem questionamentos óbvios.

O disclaimer aqui é o seguinte: Eu não tenho filhos. Só que, como vamos ver a seguir, o fato de não ter filhos, neste caso, provavelmente me coloca em situação de VANTAGEM para falar do assunto, e não de desvantagem (afinal, quando se fala em filhos, o enviesamento é bravo…).

Porém, ao longo da minha carreira profissional orientando indivíduos e famílias na gestão de seus patrimônios (e também em algumas situações pessoais e familiares), eu já tive a oportunidade de ver filhos adultos ARRUINAREM os próprios pais, financeiramente e pessoalmente.

É uma situação muito complicada pois, por conta dos laços envolvidos, os pais, muitas vezes, se permitem arruinar – não de forma deliberada e consciente, mas num verdadeiro show de justificativas, negações e racionalizações.

Inclusive, já quero deixar, como sugestão de leitura complementar, um outro artigo aqui do site: Abuso e violência financeira contra o idoso.

O principal problema – Não enxergar o óbvio

Falar de relações conflituosas entre pais e filhos é sempre um assunto espinhoso. Falar de relações conflituosas entre pais e filhos quando tem dinheiro envolvido é algo espinhoso à enésima potência…

O maior problema é que uma boa parte dos pais não enxerga (ou não quer enxergar) que está sendo explorada. Até porque raramente essa exploração dos filhos acontece de forma explícita e agressiva.

O filho dependente e explorador não costuma ser o sujeito truculento que entra na casa dos pais chutando a porta e fala “me dá dinheiro senão eu encho vocês de porrada”. Pelo contrário, a coisa vai muito mais da linha do “Oh mamãe, eu te amo tanto, você é tão boa para mim, eu sou tão abençoado de ter você como mãe… a propósito, tem ‘milzinho’ aí pra me emprestar?”.

E os pais acabam tendo uma tendência natural de “aliviar” para o lado dos filhos.

É algo compreensível (afinal, fomos evolutivamente programados para proteger nossos descendentes), mas deixa de ser tão compreensível quando a própria situação material dos pais corre o risco de ficar comprometida.

O ponto é que é incomum que pais que estejam sendo explorados financeiramente por filhos adultos reconheçam e admitam essa situação.

“Seu filho é acima da média”

Um dos vários vieses cognitivos que afeta nossos julgamentos e decisões é o chamado “viés de superioridade”. O viés de superioridade é aquele que faz com que acreditemos ser melhores do que realmente somos. É o viés que faz com que acreditemos que somos motoristas, investidores ou seja-lá-o-que-for “acima da média”.

Esse viés é extensível aos filhos também. Pais tendem a acreditar que seus filhos são “acima da média” e frequentemente superestimam (ou aumentam descaradamente) as capacidades profissionais e acadêmicas dos próprios filhos.

Eu vejo tantos pais falando que seus filhos são inteligentíssimos e bem sucedidos que eu me pergunto, às vezes, se as pessoas medíocres (ou ineptas) simplesmente “surgem do nada”, de forma espontânea. Essas pessoas não devem ter pais… Ou, então, os pais realmente NÃO ENXERGAM, na realidade, quem são os próprios filhos.

E eu imagino que deva ser muito difícil para um pai ter que admitir, em algum momento, que o próprio filho é uma pessoa medíocre (não no sentido pejorativo, mas no sentido de “mediano”).

Por isso, para interromper (ou evitar) a exploração financeira, a primeira coisa que os pais devem fazer (e isso é difícil…) é enxergar a realidade. Quem é seu filho, afinal, numa escala de sucesso profissional e financeiro?

Vamos ver a seguir.

Entendendo o grau de autonomia financeira de seus filhos

Para ajudar a enxergar melhor onde seus filhos estão, eu criei uma “escala de autonomia financeira”, que vai da total dependência financeira (no lado esquerdo) até a independência financeira absoluta que, tipicamente, coincide com uma vida profissional extremamente bem sucedida (na extremidade direita).

Eu também tracei uma curva normal (“curva de sino”) com uma distribuição das pessoas conforme seus graus de autonomia financeira. O ponto médio da curva representa aquela pessoa que não é nenhum exemplo de sucesso financeiro, mas que consegue, minimamente, cuidar da própria vida sem pedir socorro para os pais.

O sujeito que está no meio é a pessoa medíocre (novamente, no sentido não pejorativo), o típico “Zé Arruela” (ok, desta vez estou sendo pejorativo…).
E eu criei seis categorias (três para cada lado da linha média) para que você possa classificar seus filhos conforme a autonomia financeira.

Então observe que temos seis categorias, que eu numerei conforme a quantidade de observações.

(Os dados utilizados para construir essa distribuição vieram do renomado “Instituto de Pesquisas Enxergue o Óbvio”)

Curva de sino mostrando as categorias de autonomia financeira dos filhos

Categoria 1

Aqui estão os filhos moderadamente bem sucedidos profissionalmente e que têm um grau de autonomia financeira. Talvez não tenham uma vida lá muito boa e vivam sempre meio “apertados”, mas não precisam de socorro financeiro dos pais.

São filhos que, provavelmente, não vão encher os pais de orgulho (pelo menos não pelo sucesso profissional e financeiro) mas, por outro lado, também não vão dar trabalho.

Categoria 2

Aqui estão aqueles filhos que tiveram sucesso profissional e atingiram uma indiscutível autonomia financeira.

Esses são aqueles filhos de quem os pais gostam de falar, cheios de orgulho, nas festas de família, que receberam uma promoção ou que estão atendendo pessoas importantes e famosas.

Dificilmente um filho, nesta categoria, vai dar trabalho para os pais em algum momento.

Categoria 3

Aqui é onde estão os filhos que são absolutamente bem sucedidos em níveis “fora da curva” (neste caso, literalmente). Esses são aqueles filhos que vão se tornar pessoas famosas, ricas e importantes, de altíssimo status.

Aqui, você não precisa ter nenhuma preocupação com a autonomia financeira de seu filho. Seu filho não irá te explorar. Aliás, é mais provável que, nesta situação, VOCÊ acabe querendo explorar seu filho…

Categoria 4

Aqui estão aqueles filhos que estão na média, mas não têm uma autonomia financeira plena e, ocasionalmente, precisam de ajuda financeira.

Porém, essa ajuda financeira costuma ser pontual ou temporária. E, por ser pontual e/ou temporária, essa ajuda financeira talvez nem deva ser chamada de “exploração”. Mas ainda assim é uma situação preocupante pelo potencial de deterioração da situação.

Aqui estão aqueles filhos que, ocasionalmente, dão “algum trabalho”, mas não são fonte de grande preocupação.

Categoria 5

Aqui é onde estão aquelas pessoas que são, de fato, “fracassadas”. Pessoas adultas que têm condições físicas e cognitivas de conquistar autonomia financeira, mas que, por alguma razão, “não dão certo na vida”.

São pessoas que se tornam cronicamente dependente dos pais, inclusive em idade adulta avançada (assumindo que os pais estejam vivos). E, se não tiverem os pais para explorar, se tornarão dependentes de outra pessoa (um cônjuge, um ex-cônjuge, algum outro parente…).

As pessoas nesta categoria são parasitas (de novo, não em um sentido pejorativo, mas no sentido literal, de que precisam de um organismo hospedeiro para sobreviverem).

Categoria 6

Aqui estão pessoas que são financeiramente dependentes de forma definitiva e irreversível. São, usualmente, pessoas que sofrem limitações de natureza física e/ou cognitiva e que não conseguirão uma autonomia financeira plena (nem que queiram e que se esforcem muito para isso).

Neste caso, não cabe falar em exploração. É uma situação “da Natureza”, que independe de escolhas ou de disposição.

Como ajudar (de verdade) seus filhos

Se seus filhos precisam de ajuda financeira pontual e esporádica, isso não é uma situação ideal, mas, por outro lado, não necessariamente é um problema. Coisas pontuais e esporádicas são, por definição… pontuais e esporádicas!

O grande problema é quando seus filhos precisam de socorro financeiro regular. Neste caso, eles precisam de ajuda. E a “ajuda” que eles precisam NÃO É DINHEIRO, e sim um “chacoalhão” ou, na melhor das hipóteses, algum tipo de orientação para que eles consigam andar com as próprias pernas.

O que fazer para cada categoria de autonomia financeira

Os filhos que estão nas categorias 1, 2 e 3 não são fonte de preocupação e não precisam de nenhum tipo de ajuda.

Os filhos na categoria 4 são aqueles que podem precisar de ajuda esporádica e pontual. Eles podem prejudicar a qualidade de vida dos pais ao os manterem em um estado de “sobrealerta”. Por exemplo, os pais podem deixar de fazer alguma coisa que eles queiram (uma viagem, por exemplo), para terem reserva financeira adicional para salvar a pele de um filho na eventualidade de uma “escorregada”.

Neste caso, o filho deve ser orientado a, ele próprio, constituir suas reservas financeiras para emergências e a fazer um plano de desenvolvimento profissional de longo prazo, para assegurar mais autonomia e conforto material.

Os filhos da categoria 6 são aqueles que não há muito o que fazer. Como a dependência financeira deles vem de fatores que estão acima de vontade, disposição ou capacidade, cabe aos pais fazerem seus planos de longo prazo considerando que terão que acomodar as necessidades desses filhos dependentes em suas vidas.

Ainda que filhos considerados “incapazes” possam ter rendas oficiais e benefícios sociais para dar cabo de suas necessidades, dificilmente eles conseguirão viver sem algum tipo de apoio familiar.

Então, neste caso, não cabe falar em autonomia financeira. Tem que ajudar e “ponto final” – não é uma questão financeira, e sim uma questão moral.

A grande encrenca está na categoria 5, que são aqueles filhos dependentes que não sofrem de limitações cognitivas (talvez não sejam indivíduos “muito brilhantes”, mas estão dentro de uma faixa de normalidade cognitiva e intelectual) mas, ainda assim, não conseguem cuidar das próprias vidas.

Os filhos nessa categoria costumam se enquadrar em três subcategorias: Os sonhadores, os acomodados e os perdidos.

Os sonhadores:

São aqueles filhos que tomaram decisões questionáveis na vida e fizeram escolhas de carreira sem considerar o valor econômico daquilo que iriam fazer.

É, essencialmente, aquele cara que acreditou na baboseira de “siga sua paixão”, investiu seu tempo estudando coisas absolutamente inúteis e hoje, previsivelmente, não encontra ninguém disposto a pagar por aquele “talento nato”.

A abordagem ideal para o filho sonhador é dar duas bofetadas na cara, depois colocá-lo sentadinho numa cadeira e ensinar um conceito básico de economia, que é o seguinte:

“A gente ganha dinheiro quando gera valor para outras pessoas. A única forma de ganhar dinheiro fazendo o que gosta é se, por coincidência, aquilo que você gosta também gera valor para outras pessoas. Agora, tome vergonha na cara e arrume um trabalho de verdade”.

Os acomodados:

O acomodado é aquele que ficou nessa situação porque é confortável e porque “alguém” permitiu isso. Esse “alguém” entre aspas não está aí por acaso. Se você tem um filho acomodado vivendo às suas custas, o primeiro lugar onde você deve procurar um responsável é no espelho.

Você deve, sim, dar um chute na bunda do seu filho. Mas, antes disso, você precisa dar um chute na bunda de si próprio e assumir o compromisso de não tolerar abusos – nem de seus filhos e nem de ninguém.

E já que isso vai envolver um pouco de autocrítica, pergunte-se se o seu filho acomodado não é o resultado de uma personalidade controladora e insegura, que quer manter os filhos indefinidamente “debaixo das asas”.

Se for o caso, saiba que você está prejudicando a si próprio e aos seus filhos.

Os perdidos:

Os filhos “perdidos” são aqueles que têm dificuldades em fazer escolhas profissionais e acadêmicas. Ou que fizeram escolhas que se revelaram erradas, tomaram consciência disso e estão tentando achar um novo caminho. Neste caso, podemos dizer que a pessoa é um “sonhador em remissão”.

O filho perdido (que reconhece sua situação de perdido) é um caso em que vale um voto de confiança e um pouco mais de empatia.

Uma possibilidade é ajudar o filho a definir melhor seus objetivos, o que pode ser feito, se necessário, com ajuda de terapeutas e orientadores profissionais. Caso esses objetivos já estejam definidos e haja um plano profissional, pode-se ajudar o filho perdido a desenvolver as habilidades e competências necessárias para executar esse plano (e deixar de ser perdido).

Porém, é preciso cobrar do filho perdido que saia, o mais rapidamente possível, da situação de perdido e que encontre um rumo (sob o risco de acabar exaurindo os recursos dos pais).

E que seja um rumo viável e que “faça sentido” do ponto de vista econômico, para que seu filho não deixe de ser um “perdido” para virar um “sonhador” (ou, o pior dos cenários, um “sonhador perdido”).

Conclusão

A exploração financeira dos pais, por parte de filhos adultos saudáveis e capazes, é uma coisa insidiosa por causa das questões psicológicas e emocionais envolvidas.

Uma parte significativa dos pais que sofrem abusos simplesmente “não quer ver” a realidade, e acaba fomentando ainda mais o comportamento abusivo e dependente.

Por isso, é preciso coragem, por parte dos pais, para tomar as atitudes necessárias para cessar a exploração. Para o bem deles e para o bem dos próprios filhos.

Afinal, mesmo que os pais tolerem os abusos e a exploração, a quem os filhos exploradores vão explorar quando os pais se forem deste mundo e voltarem a ser poeira estelar?

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