Para entender o que é arbitragem geográfica (também chamada de “geoarbitragem”), é preciso, primeiramente, entender o que é “arbitragem” em um contexto de finanças e economia.
Os valores financeiros (de produtos, salários, impostos etc.) não são iguais em todos os lugares, e “arbitragem” é o nome que se dá a um conjunto de técnicas e práticas que têm, como objetivo, obter vantagem com essas diferenças de valores e preços.
Para começar, um pouco de Física e de Economia
Para entender melhor, vamos fazer uma analogia com um fenômeno físico: Por conta das Leis da Física, a água sempre busca seu próprio nível.
Os preços, salários, impostos, custos e retornos financeiros também tendem a buscar seu “próprio nível”. Porém, as leis que governam a Economia são infinitamente mais fracas que as Leis da Física e, por mais que tenhamos um mundo integrado e interconectado, ainda temos muitas ineficiências e “fricções”.
Em uma economia “super eficiente”, um torneiro mecânico (por exemplo) deveria ganhar a mesma coisa em qualquer lugar do mundo. Se um torneiro mecânico em São Paulo (ou em outro país) ganha mais que um colega em Manaus, pela lei da oferta e da demanda, os torneiros de Manaus iriam para São Paulo, ou para qualquer outro lugar onde ganhassem mais.
Essa movimentação causaria uma falta de torneiros em Manaus (aumentando a demanda), um excesso de torneiros em São Paulo (aumentando a oferta) e os preços tenderiam a se equilibrar.
Porém, sabemos que, na vida real, as coisas não são assim, por conta das tais “fricções”. A água se move (quase) sem fricções – por isso ela busca seu próprio nível. Já um médico brasileiro não pode oferecer seus serviços na China com a mesma facilidade que a água vai do ponto A para o ponto B.
Existem restrições geográficas e políticas que fazem com que os preços sejam diferentes em diferentes lugares. O torneiro de São Paulo ganha mais que o de Manaus; o mesmo modelo de automóvel é mais barato nos EUA do que na Índia; o Imposto de Renda é mais baixo no Panamá do que na Holanda e o retorno dos títulos de Renda Fixa é mais alto no Brasil do que no Japão.
O interesse pela arbitragem geográfica
Se tivermos que descrever qual é a situação do mundo, neste momento, em termos de integração, podemos dizer que ele é “parcialmente integrado”.
Estamos longe daquela visão de “aldeia global”, que se falava quando a globalização ainda era uma coisa “da moda” e festejada. As restrições de movimentação, tanto de pessoas quanto de capitais, ainda existem e, nos últimos anos, têm ficado mais rígidas (e não mais flexíveis, como previam os entusiastas da globalização).
Por outro lado, estamos suficientemente integrados no que diz respeito ao fluxo de informações, especialmente informações financeiras e econômicas. É extremamente fácil (graças à internet) saber os valores das coisas em qualquer lugar do mundo.
E, nos últimos anos, muitas pessoas vêm buscando estilos de vida alternativos com o objetivo de conquistar, mais rapidamente, a tão sonhada “independência financeira” ou, pelo menos, ter uma qualidade de vida maior (sem ter que pagar mais por isso).
Daí, o interesse por estilos de vida alternativos como o minimalismo, o “nomadismo digital”, o “movimento FIRE” (que busca uma aposentadoria antecipada) e a chamada “Flag Theory” (que é, essencialmente, um modelo radical de arbitragem geográfica).
Arbitragem geográfica – a visão individual e empresarial
A arbitragem geográfica, pela ótica do indivíduo (ou família) que busca liberdade financeira ou maior qualidade de vida, nada mais é do que a aplicação, em um nível pessoal, daquilo que muitas empresas já fazem há séculos: Otimizar seus recursos conforme as características de diferentes regiões.
Uma empresa que projeta aparelhos eletrônicos nos EUA, os fabrica na China, tem seu atendimento técnico na Índia e seu endereço fiscal na Irlanda está fazendo nada mais nada menos que… Arbitragem geográfica!
Ela está explorando as diferenças entre esses diversos fatores (disponibilidade de mão de obra qualificada, custos de produção, custos de serviço e tributação) para obter o melhor “pacote” possível para si própria – especialmente em termos de valores, para que possa aumentar sua margem.
No caso do indivíduo ou família, a lógica é a mesma: Se aproveitar dessas diferenças de preços, em diferentes lugares, para reduzir o custo de vida, de tal forma a sobrar mais dinheiro e possibilitar um estilo de vida de melhor qualidade.
O modelo ideal de arbitragem geográfica
O modelo perfeito de arbitragem geográfica é aquele em que você ganha em moeda “forte” e gasta em moeda “fraca”.
Um aposentado americano, europeu ou japonês, ou um profissional que trabalhe remotamente e ganhe nessas moedas “fortes” é um candidato ideal à arbitragem geográfica.
Para nós, brasileiros, as coisas ficam um pouco limitadas, pois o Real não tem sido, exatamente, um exemplo de “moeda forte” nos últimos tempos, e nosso poder de compra vem se deteriorando bastante em relação ao resto do mundo.
Bem… os estrangeiros agradecem, pois o Brasil se torna, para eles, uma opção de buscar preços baratos.
Mas, para aqueles brasileiros que têm a sorte (ou o talento) de trabalharem remotamente, ganhando em Dólares ou em Euros, as portas do mundo se abrem.
A arbitragem geográfica só é possível em outros países?
Se você se frustrou com o que foi dito no tópico anterior (sobre as limitações da arbitragem geográfica para brasileiros que ganham em Real), saiba que nem todas as oportunidades de arbitragem geográfica envolvem países diferentes. Existem inúmeras oportunidades de explorar diferenças dentro de um mesmo país (especialmente um país de dimensões continentais, como o nosso).
No Brasil, existem diferenças muito profundas em valores de imóveis, salários, produtos e serviços conforme a região.
Para quem mora em um grande centro urbano brasileiro, é possível encontrar um custo de vida significativamente mais barato (e, possivelmente, com qualidade de vida melhor) apenas a algumas dezenas de quilômetros de distância.
Até mesmo em termos fiscais, é possível encontrar diferenças que podem ser exploradas, tanto na esfera estadual quanto municipal. Desde municípios que oferecem condições mais favoráveis de impostos sobre imóveis (ou prestação de serviços, para os “PJs”) até estados que são menos vorazes na taxação de doações, sucessão e veículos.
Combinando a arbitragem geográfica com outros estilos de vida
O “modelo” de arbitragem geográfica a ser adotado depende muito do objetivo da pessoa.
Muitos buscam, apenas, uma melhora de qualidade de vida, sem que tenham que gastar muito mais dinheiro para isso.
Outros querem reduzir custos para chegar, mais rapidamente, à uma situação de independência financeira (é o caso dos adeptos do “movimento FIRE”). Neste caso, pode-se combinar a arbitragem geográfica com o estilo de vida minimalista. Dessa forma, não se busca uma melhora expressiva do padrão de vida (ou até se faz algum sacrifício). O foco, aqui, é se tornar independente o mais rápido possível, nem que seja reduzindo o padrão.
Alguns recursos e informações para interessados em geoarbitragem
Se você se interessou pela ideia de buscar lugares mais baratos (e potencialmente melhores) que o Brasil, vou deixar duas sugestões de sites que são muito famosos e muito utilizados pela comunidade dos nômades digitais, expatriados e outros que se interessam pelo assunto.
Os dois sites são em Inglês, mas, se você cogita a possibilidade de ir embora do Brasil, eu vou assumir que isso não será uma limitação para você.
Os dois sites fazem estimativas de custo de vida em diferentes lugares do mundo. Com eles, você pode ter uma ideia de quais seriam os lugares “bacanas” para você viver, dentro de suas possibilidades financeiras.
Os links estão a seguir:
Um aviso importante: os valores apresentados por esses sites são estimativas e aproximações, que não consideram variações de estilo de vida e gostos pessoais. Por isso, tome os dados de sua pesquisa apenas como uma referência e um “ponto de partida”.
Se você quiser, realmente, colocar o seu “plano de saída” em ação, precisará fazer uma pesquisa mais aprofundada (talvez, até mesmo, indo ao próprio local).
Conclusão
A arbitragem geográfica não é, por si só, um “estilo de vida alternativo”, e sim uma prática de otimização de recursos.
Por exemplo: Meu logotipo (sim, esse aí que você vê no topo do site) foi feito por um designer da Indonésia, por um valor que foi uma fração daquilo que me foi pedido por um designer brasileiro “mediano”.
É um exemplo limitado e pontual de arbitragem geográfica, que não envolve me mudar para outro lugar ou virar minha vida de cabeça para baixo. Simplesmente vi que era mais barato lá do que aqui… e tirei proveito disso.
Você também pode explorar inúmeras oportunidades de arbitragem geográfica, sem, necessariamente, ter que mudar seu estilo de vida.
E, com o avanço das comunicações (especialmente via internet) e a disponibilidade de informações, essas oportunidades vão ficando cada vez mais visíveis.