Os temas mais importantes de finanças pessoais são, muito provavelmente, consumo e renda. E, nesses dois campos da vida, teremos (muito) mais sucesso se tivermos um domínio minimamente funcional de algumas técnicas de barganha e de negociação.
O tal “Método de Ackerman” é descrito no livro “Negocie como se sua vida dependesse disso” (Never Split the Difference, no original) de Chris Voss, um ex-negociador do FBI que se tornou consultor em negociação empresarial. Segundo o autor do livro, ele aprendeu essa técnica com um ex-agente da CIA chamado Mike Ackerman e era usada com sequestradores e terroristas. Ou seja, só gente “do bem”…
Por que é importante sabermos negociar?
A pergunta pode ser meio óbvia. Precisamos saber negociar para extrairmos o melhor de nossas negociações. Mas tem um outro ponto que acaba sendo frequentemente esquecido: É importante conhecermos as técnicas de negociação para saber quando ALGUÉM ESTÁ APLICANDO essas técnicas sobre nós.
Existem aqueles “negociadores naturais”, que já nascem com uma habilidade inexplicável. Mas a negociação pode ser traduzida em um conjunto de técnicas que, ao menos em princípio, qualquer um pode aprender. E muitas pessoas que aprendem essas técnicas de negociação não são capazes de aplicá-las com muita “sutileza”.
Conseguir identificar, rapidamente, que seu interlocutor está utilizando uma técnica de negociação “enlatada” é algo que pode, de forma imediata e decisiva, desarmar seu oponente e colocar toda a negociação a seu favor.
O Método de Ackerman é uma técnica interessante e potencialmente efetiva, mas, se não for aplicada com a devida sutileza, se torna uma reles “receita de bolo” facilmente identificável e, uma vez que a técnica é identificada, o que vai acontecer vai depender do seu “grau de maldade”. Você pode ajudar seu interlocutor a chegar rapidamente numa conclusão da negociação (o que seria um cenário positivo para ambos) ou (num cenário negativo), simplesmente, humilhá-lo e desestabilizá-lo emocionalmente, dizendo algo como “E aí, seu chefe te obrigou a fazer um curso de negociação e agora você está querendo treinar comigo?”.
Uma observação sobre “barganha”
Algumas pessoas têm uma necessidade compulsiva de barganhar, de pechinchar. Não se sentem satisfeitas se não arrancarem alguma “coisinha a mais” do interlocutor. Particularmente, eu acho esse comportamento desagradável (aqui é minha opinião, então não precisa concordar comigo) e acabo vendo, nesse comportamento, um traço de personalidade de pessoa com desejo de controle ou adepta da infame “Lei de Gerson” (quer levar vantagem em tudo).
Seja como for, o próprio autor do livro faz uma ressalva que, numa negociação bem conduzida desde o começo, a fase da barganha e da pechincha é desnecessária (e, neste ponto, concordo com ele). Uma boa negociação é aquela que termina com duas pessoas satisfeitas; não com um vencedor e um perdedor…
O Método de Ackerman – passo a passo
A correta aplicação da técnica vai envolver um pouco das suas “habilidades teatrais” (por isso ela é fácil de identificar quando aplicada por alguém sem o devido “traquejo”).
O primeiro passo para aplicar a técnica é estabelecer o preço-alvo da negociação. É o preço pelo qual você está disposto a fechar o negócio.
A partir do preço-alvo, você vai definir o preço de início da negociação (aquele que vai ser oferecido ao interlocutor), que será de 65% do valor do preço-alvo (atenção a esse número) e vai definir três “incrementos” para chegar até o preço-alvo.
Vamos ver o exemplo abaixo:
- Preço-alvo da negociação: R$ 1.000.000,00
- Preço da oferta inicial: R$ 650.000,00 (65% do preço-alvo)
- Primeiro incremento: R$ 850.000,00 (adiciona 20% do preço-alvo)
- Segundo incremento: R$ 950.000,00 (adiciona 10% do preço-alvo)
- Terceiro incremento (final): R$ 1.000.000,00 (adiciona os 5% restantes do preço-alvo)
- Último passo: “Fechar” a oferta com um número “quebrado” (no caso do nosso exemplo, algo como R$ 998.027,36) e oferecer alguma vantagem não-monetária (que, provavelmente, não será aceita pelo interlocutor).
Aplicação: a “psicologia” por trás do Método de Ackerman
No nosso exemplo, observe que, após o primeiro incremento, cada incremento subsequente tem, exatamente, metade do valor do anterior (20%, 10% e 5%). Isso não é por acaso e faz parte da técnica.
Agora vem a parte do “teatrinho”: A cada incremento, quem está utilizando a técnica deve externar que aquilo é muito sacrificante. Idealmente, o sujeito deve fazer uma cara de dor de barriga e ficar rolando no chão dizendo “ahhhh…. desse jeito você está me matandooooo” até ceder o incremento.
E, aqui, mais um detalhe importante. A cada incremento o “drama” deve ser o mesmo, com a mesma intensidade… Mas o benefício financeiro do incremento tem que ser cada vez menor (por isso que cada incremento adicional é metade do anterior). Isso é feito para sinalizar, para o oponente, que a margem para concessões está se esgotando.
A ideia de todo esse teatro é fazer a outra ponta da negociação achar que está “te arrancando um braço” a cada passo dessa progressão de barganha. O sujeito vai, supostamente, pensar “nossa, ele está realmente sofrendo com isso” e vai achar que arrancou “tudo e mais um pouco” de você. Isso mexe com o nosso desejo de “sempre levar vantagem”.
No final, quando se chega no preço-alvo, é importante apresentar um número “todo quebrado”, para dar a impressão de que se chegou naquele número “com dor”, e cada centavo ali foi meticulosamente calculado.
Aí, a “cereja do bolo” é ofertar algum item não monetário (que provavelmente não será relevante para o interlocutor e não será aceito). A função desse item não monetário é comunicar para o interlocutor que “acabou a capacidade de negociar com dinheiro”.
Imagine que o objeto de negociação seja um imóvel (preço-alvo de um milhão). Quando a negociação chega no preço-alvo que o vendedor estabeleceu, ele fala algo como “e eu me proponho a trocar a lâmpada do seu hall de entrada por seis meses” (benefício irrelevante, mas que sinaliza que as concessões de natureza financeira se esgotaram).
Conclusão
O Método de Ackerman é efetivo e mexe com “emoções profundas”. Segundo o autor, ele foi testado e validado nos cenários de negociação mais duros que existem, que são negociações que envolvem reféns e situações de vida e morte.
Só que… Esse método foi descrito em um livro best seller, que virou um item básico de inúmeros cursos e treinamentos sobre negociação. Isso significa que, agora, tem um monte de gente que aprende essa técnica em um seminário de um final de semana e sai aplicando “a torto e a direito” por aí…
Por isso, caso você resolva aplicar essa técnica numa negociação, faça com sutileza e elegância… e torça para que seu interlocutor não tenha lido o mesmo livro que você!
Procure não usar a técnica como se fosse uma “receita de bolo” para que não fique tão obvia e ela perca a efetividade. Use os princípios básicos e dê seu “toque pessoal”.
E, caso você identifique alguém tentando aplicar, em uma negociação com você, essa técnica, você já saberá quais são os passos seguintes de seu interlocutor e, a partir daquele momento, o controle da negociação passa a ser seu.