Orçamento Base Zero (ou OBZ) é uma metodologia de orçamento que tem, como principais objetivos, proporcionar redução de custos e quebrar alguns “modelos mentais”. Essa parte dos “modelos mentais” pode ter ficado um pouco estranha, mas vou explicar isso ao longo do texto.
O Orçamento Base Zero foi concebido, originalmente, como uma ferramenta de gestão empresarial, porém ele pode ser (e é) facilmente adaptado para um contexto de planejamento financeiro pessoal.
Para termos um entendimento melhor do OBZ e como ele funciona, é importante entendermos o “orçamento” de uma forma geral.
O que é um orçamento
Um orçamento é, essencialmente, uma tentativa de fazer um planejamento financeiro do futuro. Simples assim.
Num orçamento, se estima quanto dinheiro vai ser recebido e gasto em determinado período de tempo. Com isso, o gestor pode ter uma ideia de quanto dinheiro vai precisar e que tipo de expectativa pode ter em termos de resultados financeiros.
Só que, como já sabemos muito bem, essa coisa de “antecipar o futuro” não é nada fácil. E, como tudo aquilo que se propõe a falar do futuro, um orçamento está sempre sob o risco de virar uma mera obra de ficção.
Como prever o futuro
Existem inúmeras formas de tentar antecipar o futuro. Existem desde as formas mais científicas e elaboradas (como modelos econométricos baseados em regressões) até aquelas que são puro misticismo.
Porém, de todas as maneiras de prever o futuro, a que mais acerta (ou menos erra, se preferir) é, simplesmente, olhar para o passado e assumir que, de alguma forma, o futuro vai ser uma continuação do passado.
A forma mais comum de fazer um orçamento
Fazer um orçamento é fácil – o difícil é acertar o futuro…
Por isso, previsivelmente, muitos gestores buscam as informações do passado para fazer inferências sobre o futuro. Tipicamente, se olha as receitas e despesas de um período anterior (um ano, por exemplo) e se faz ajustes de coisas que os gestores já sabem, previamente, que vão mudar.
Por exemplo, se um departamento vai contratar um novo funcionário (sem demitir ninguém), já é sabido que vai haver um aumento de despesas de determinada ordem. Isso é algo sobre o qual se tem alguma previsibilidade. Se a despesa com pessoal é um milhão de reais e esse novo funcionário vai ter um custo anual estimado de cem mil, já se sabe que a despesa “base” vai ser de um milhão e cem.
Aí, se estima quanto vai ser o dissídio (geralmente também se faz isso vendo os anos anteriores), se adiciona alguma margem de segurança… e pronto! Já temos uma estimativa do futuro baseada em dados históricos e em mudanças de gastos que já foram definidas no presente.
Cada departamento faz seu orçamento. Esses orçamentos vão para uma outra área que centraliza tudo (uma controladoria ou algo do gênero) e pronto, temos um orçamento!
Mais que isso, temos um orçamento com boas chances de acerto em suas previsões, especialmente se as informações históricas em que ele foi baseado forem consistentes.
Num contexto de finanças pessoais é a mesma coisa: Se uma família gastou, no ano anterior, mil reais por mês no supermercado, há uma grande chance de que ela continuará gastando algo dessa magnitude no ano seguinte. Isso assumindo, naturalmente, que a família vai continuar do mesmo tamanho, que os hábitos de consumo não vão mudar e que a inflação não vai disparar. Mas, mudanças estruturais na família, como um filho novo, por exemplo, podem ser previstas e planejadas (nem sempre são, mas poderiam ser…). Então, é só uma questão de projetar os dados do passado para o futuro adicionando uma “nova boca”.
O problema do orçamento tradicional (que o OBZ se propõe a resolver)
O maior problema de um orçamento tradicional é, exatamente, a dependência dos dados históricos. Às vezes, as informações históricas não são conhecidas (por descontrole) e a empresa (ou família) é obrigada a estimar valores para projetar para o futuro. Ou seja, é a “estimativa da estimativa”.
O segundo (grande) problema é que fica muito cômodo para uma empresa ou família simplesmente pegar os valores anteriores e “chutar pra frente”, sem fazer qualquer tipo de análise crítica. É o famoso “pega o valor do ano passado, mete dez por cento em cima e vamo que vamo!”
Quando se adota essa postura “comodista”, oportunidades de reduzir e otimizar gastos são perdidas.
Por que “Base Zero”
O Orçamento Base Zero descarta as informações passadas. O nome “Base Zero” vem do fato de que ele está, previsivelmente, partindo do zero. É um “livro em branco”. Ele parte do princípio de que não há memórias do passado, e os gestores responsáveis pelo orçamento vão ter que estimar cada gasto e JUSTIFICAR aqueles gastos com base não naquilo que se gastou no passado, e sim na utilização de recursos no futuro.
Voltando ao nosso exemplo hipotético do departamento que vai contratar um novo funcionário, ele não pode simplesmente pegar o número do ano passado, adicionar mais um funcionário, estimar o dissídio e “tocar pra frente”. Aquele gestor vai ter que JUSTIFICAR por que precisa daquela quantidade de funcionários, e pagando aquele valor, para que os resultados sejam atingidos.
O Orçamento Base Zero acaba forçando, então, um “exercício mental” que obriga os gestores a terem uma visão mais clara daquilo que estão fazendo. O OBZ combate a famosa “ancoragem” (um viés cognitivo famoso no mundo das finanças) forçando o gestor a abandonar as referências do passado.
Quando as pessoas vão, simplesmente, “rolando” o passado para o futuro, chega um momento em que elas não sabem mais os “porquês” de fazer aquilo. A análise crítica dos gastos (forçada pela adoção do Orçamento Base Zero) acaba escancarando gastos desnecessários que, muitas vezes, a empresa sequer se lembra por que razão estão lá…
Enfim, o Orçamento Base Zero (OBZ) resolve dois grandes problemas: O primeiro é a dependência de dados históricos e o segundo é o comodismo (e, neste caso, quero dizer que não estou falando, necessariamente, de comodismo no sentido depreciativo, e sim como uma consequência da ancoragem cognitiva – algo que afeta a todos nós).
Qual é o problema do Orçamento Base Zero
Nós vimos os dois grandes problemas que o Orçamento Base Zero resolve e, vendo por esse lado, o OBZ é uma coisa maravilhosa e milagrosa. Porém, sempre tem uma “pegadinha”…
E a pegadinha, neste caso, é o seguinte: Fazer o Orçamento Base Zero dá um TRABALHO DO CACETE e, conforme as circunstâncias, pode ser uma coisa antieconômica.
Imagine o gestor de um departamento tendo que justificar cada cartucho de tinta que o departamento dele usa (sim, a coisa pode chegar nesse grau de detalhamento). Imagine uma família tendo que fazer ginástica mental para saber quantos sabonetes são usados em um mês…
No passado, muitas empresas adotaram o Orçamento Base Zero e o abandonaram, pois concluíram que o trabalho de implementar o OBZ era maior e mais custoso que os problemas que ele se propunha a resolver.
Porém, o Orçamento Base Zero vem voltando a ter alguma popularidade (especialmente nas empresas) por conta da popularização de sistemas e ferramentas tecnológicas que eliminam, ao menos parcialmente, boa parte do “trabalho braçal” envolvido no OBZ.
A melhor forma de implementar o Orçamento Base Zero
Como em muitas coisas no mundinho da gestão financeira, seja empresarial ou familiar, não há consenso sobre qual a melhor forma de implementar o OBZ (ou mesmo se ele deve ser implementado).
Aqui vai, então, o meu “pitaco”:
Para empresas
Para evitar grande pressão sob os gestores, implementar um “OBZ periódico” em cada departamento, em intervalos regulares. Por exemplo, ao invés de fazer o OBZ todo ano (o que pode ser uma medida radical e excessivamente trabalhosa – mesmo com o apoio de sistemas de informação), fazer o Orçamento de Base Zero, por exemplo, a cada cinco anos.
Assim, a cada cinco anos o gestor será obrigado a fazer aquele exercício mental de buscar justificativas para cada gasto em seu departamento. Numa empresa com cinco departamentos, a prática de implementar um OBZ a cada cinco anos por departamento (em esquema de “rodízio”) faria com que, todo ano, um departamento fizesse uma análise crítica de todos os seus gastos.
Para indivíduos e famílias
Na minha experiência com planejamento financeiro pessoal, o maior problema das pessoas é que elas não sabem o quanto ganham e quanto gastam. Na verdade, a maioria das pessoas “acha” que sabe, mas muitas vezes isso é baseado em estimativas mentais que se revelam completamente furadas quando são “colocadas no papel”.
No caso de uma família típica (completamente desorganizada), a implementação de um orçamento tradicional fica complicada por as pessoas não sabem o quanto gastam. Então, muitas vezes se recomenda que fiquem um período (por exemplo, três ou seis meses) anotando todas as receitas e despesas para ter uma base sólida para a confecção de um orçamento.
A adoção do Orçamento Base Zero, neste caso, pode abreviar esse processo. Como não há necessidade de ter dados históricos, o OBZ pode ser implementado imediatamente (bem, na verdade, não “tão imediatamente” assim pois, como foi comentado, analisar e justificar todos os gastos não é tarefa pequena…).
Inclusive, numa família, é possível utilizar algo similar àquilo que foi sugerido para empresas: Que se faça um OBZ periódico. Inclusive, é possível fazer isso por grupo de despesas (por exemplo “este ano vamos fazer um OBZ para as despesas de lazer). Assim como uma empresa pode fazer um OBZ periódico por departamento (num esquema de “rodízio”), uma família pode fazer por grupos de despesas.
Conclusão
O Orçamento Base Zero é uma excelente ferramenta de gestão financeira (acho que isso não se discute). Ele, de fato, tem o potencial de resolver os problemas que se propõe a resolver.
Porém, como foi mostrado neste artigo, sua implementação não é uma coisa muito fácil, obrigando gestores (ou indivíduos, no caso do planejamento pessoal) a justificar, de forma detalhada, todas as suas despesas.
O uso de ferramentas tecnológicas e sistemas vem facilitando a implementação do OBZ, mas, ainda assim, cabe a empresários, gestores e indivíduos definirem se o trabalho exigido em sua implementação compensa as eventuais economias e eficiências que ele pode trazer.