Existem inúmeras formas de definir o que é pensamento crítico (alguns dizem, também, “raciocínio crítico”).
Talvez a definição mais “acadêmica” seria algo como “a aplicação da lógica informal nos processos de raciocínio e decisão”. Mas outras definições podem se aplicar, como as seguintes:
- Saber fazer as “perguntas certas”
- Ter consciência de que nosso raciocínio é falho, limitado e enviesado
- O oposto de “pensamento automático”
- “Ceticismo saudável”
- Disciplinar a própria mente e o raciocínio
Enfim, o pensamento crítico é um conjunto de habilidades de raciocínio que envolve metacognição (“pensar sobre o próprio pensamento”), coleta e avaliação de evidências, avaliação lógica de argumentos e avaliação de quadros de referências (os frames).
Argumento – O objeto de análise do Pensamento Crítico
Praticamente “tudo” em nossa comunicação, tanto interna (conosco mesmos – nosso diálogo mental) quanto externa (com outras pessoas) está apoiado em argumentos.
É baseado em argumentos que formamos nossas crenças, nossas visões de mundo e tomamos nossas decisões.
Leia aqui: O que é um argumento
Os erros e acertos que fazemos em nossas vidas são resultados de decisões; e decisões são baseadas em argumentos.
Por isso, uma melhor avaliação e entendimento dos argumentos pode nos levar a não cometer erros ou (sendo mais realista), pelo menos, a “errar menos”.
Um argumento é um conjunto de declarações. Essas declarações são as “premissas” e a “conclusão”.
É assim mesmo, “premissas” no plural (pode ser uma ou mais premissas em um argumento) e “conclusão” no singular (um argumento tem apenas UMA conclusão).
Existem formas de classificar e decompor os argumentos (como os argumentos dedutivos e indutivos) que fogem do escopo deste artigo (que é apenas “apresentar” o pensamento crítico para aqueles que não conhecem tão bem).
Mas, neste momento, o que se precisa saber sobre argumentos é que eles são formados de premissas e de uma conclusão.
As premissas são declarações que implicam em algum tipo de pressuposição (algo que é “presumidamente verdadeiro”) e dão a “base” para que se forme uma conclusão.
A conclusão é algo que deriva das premissas e é o “produto final” do processo lógico. As conclusões nos levam a decisões, ações, atitudes e a fazer previsões sobre o futuro.
Em processos de raciocínio mais complexos, a conclusão de um argumento pode virar a premissa de outro, formando uma grande “cadeia” de raciocínio.
Abaixo: Gravação de uma palestra de curta duração sobre Pensamento Crítico feita por mim, em 2019, no Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA-SP)
Os problemas dos argumentos
Preciso avisar uma coisa neste momento: o pensamento crítico não é uma coisa “supersimples”. Não é uma receitinha de bolo na linha “cinco passos para ser feliz”.
O pensamento crítico exige um pouco de estudo (para entender essa dinâmica dos argumentos, premissas e conclusões) e exige uma grande disciplina mental, pois não é uma coisa muito intuitiva.
A nossa mente não gosta muito de pensar criticamente, pois isso exige um certo esforço e uma “saída da zona de conforto”.
Em circunstâncias normais, nossa mente sempre vai optar pelo “caminho fácil” do pensamento automático, que nos leva a conclusões rápidas e, frequentemente, erradas.
Mas, feita essa ressalva (de que existe uma certa complexidade nos argumentos e no pensamento crítico em si), quero falar, de uma forma simples (talvez beirando o “simplismo”) quais são os dois grandes problemas dos argumentos (que o pensamento crítico tenta identificar):
- Premissas “furadas”
- Conclusões ilógicas
Em resumo, é isso que o pensamento crítico faz. Avaliar argumentos em busca de premissas furadas e/ou conclusões ilógicas.
Por que o pensamento crítico é importante
O “porquê” do pensamento crítico é bastante obvio. Nossas crenças e decisões são baseadas em argumentos.
Por sua vez, se esses argumentos são baseados em premissas furadas e/ou conclusões ilógicas, nossas crenças e decisões serão igualmente furadas e/ou ilógicas.
Isso, por si só, já é um problema grande o suficiente. Porém, as coisas se agravaram nos últimos tempos por conta do EXCESSO DE INFORMAÇÃO.
Hoje, vivemos “soterrados” em informações. E grande parte dessa informação é ambígua, irrelevante, enviesada (cheia de “segundas intenções”) ou, simplesmente, errada.
Cada vez mais vemos pessoas (e mesmo veículos de mídia) misturando fatos com opiniões e vivemos um momento em que a verdade pode ser uma coisa perigosa.
Nesta época de “politicamente correto” e de “pós-verdade”, falar a verdade pode custar muito caro (especialmente quando a verdade contraria os interesses e as crenças de certos grupos).
Atualmente, não há comprometimento com a verdade (bem… não tenho certeza se algum dia já houve). Mas o ponto é que a ocultação da verdade (de forma deliberada ou não) para não “ferir as sensibilidades” de certos grupos ou para, simplesmente, manipular a opinião das pessoas está em níveis altíssimos, potencializada pelo excesso de informação e pela rapidez com que essa informação circula.
O pensamento crítico tenta, então, nos mostrar a “verdade”, para que possamos formar nossas crenças e tomar nossas decisões em bases mais… verdadeiras!
Pensamento crítico é compromisso com a verdade
No começo deste artigo, mencionei “ceticismo saudável” como uma das possíveis definições de pensamento crítico.
O ceticismo é o “estado natural” da Filosofia e da metodologia científica.
Partimos do princípio de que as coisas “não existem” até que surja uma evidência em contrário.
Porém, é muito importante ressaltar o “saudável” em “ceticismo saudável”. Isso pois, lamentavelmente, muitas pessoas confundem ser “cético” com ser “do contra”.
Ser “do contra” é ser cético A DESPEITO das evidências a favor de um argumento. É “negar a verdade”. Isso é o oposto de “ceticismo saudável” e, na verdade, é uma forma de burrice.
Ser “do contra” é, geralmente, um sinal de imaturidade, de carência afetiva (querer ser “diferentão” para chamar a atenção) ou de alguma limitação de natureza cognitiva.
Características de quem pensa criticamente
O “pensador crítico” é aquele que consegue fazer uma boa avaliação dos argumentos antes de formar crenças e tomar decisões.
Uma coisa que é importante dizer é que NINGUÉM consegue pensar criticamente 100% do tempo. O pensamento crítico é, como foi dito anteriormente, o oposto de “pensamento automático”.
Só que nós pensamos de forma automática a maior parte do tempo e não tem como ser diferente. Existem momentos na vida que exigem rapidez e decisões baseadas em heurísticas (“atalhos mentais”) ou em que é, simplesmente, antieconômico gastar “energia mental” avaliando um argumento em uma situação de baixo risco e baixa relevância.
Por isso, o que diferencia um pensador crítico de outras pessoas é usar “mais e com mais frequência” as ferramentas de pensamento crítico, e não pensar criticamente o tempo todo.
Uma pessoa que pensa criticamente o tempo todo teria que ser uma pessoa 100% lógica – isso está além da capacidade de um ser humano.
Ou seja, mesmo os melhores “pensadores críticos” passam por momentos de irracionalidade (e não são poucos…).
Mas, feita a ressalva de que ninguém pensa criticamente “o tempo todo” (isso é para robôs e computadores – não para pessoas), podemos listar algumas habilidades dessas pessoas que conseguem pensar criticamente “mais do que a média”:
- Metacognição (capacidade de pensar sobre o próprio pensamento)
- Capacidade de isolar problemas de seus respectivos contextos
- Capacidade de raciocinar logicamente (abdução, dedução, indução)
- Ter “mente aberta” (ressaltando que ter mente aberta não é “aceitar tudo”, e sim estar disposto a analisar argumentos)
- Capacidade de questionamento
- Capacidade de avaliar a relevância das informações
- Capacidade de distinguir entre alegações racionais e emocionais
- Saber separar fato de opinião
- Saber identificar quando uma evidência pode estar comprometida ou distorcida
- Saber reconhecer que um problema pode não ter resposta (ou, pelo menos, não uma resposta simples)
- Saber pesquisar e buscar informações
Enfim, pensamento crítico é um conjunto de habilidades que pode e DEVE ser desenvolvido.
Uma coisa eu digo: Quando se pensa criticamente, a vida fica “mais chata”. É mais ou menos como ver o seu prato favorito sendo preparado – as coisas perdem um pouco da graça e da magia.
Mas, às vezes, essa “graça” da vida (que muitas vezes é ilusória) vem a um custo alto demais: De crenças e decisões erradas que, na melhor das hipóteses, “atrasam a vida”.
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Comentários
A capacidade de reflexão exige a capacidade de apresentar razões para suas premissas (mesmo as mais básicas), avaliar argumentos, decidir que informações aceitar ou rejeitar. Exige que procuremos as estruturas e conexões que relacionam conceitos e fatos diversos, buscando padrões que denotem similitudes e diferenças, inconsistências ou revelem a necessidade e suficiência de determinadas premissas.
O questionamento contínuo, por sua vez, exige uma atitude permanente de questionar premissas e conclusões. O objetivo deve ser, sempre, compreender se de fato há base teórica e empírica para considerá-las aceitáveis ou não.
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